quinta-feira, 8 de maio de 2014

O Silêncio dos Amigos


Segunda foi um dia com várias reuniões no trabalho, todas realizadas via conferências pela internet já que minha equipe é composta por pessoas de São Paulo e do Rio de Janeiro. Durante uma dessas reuniões, a ultima do dia, fiz uma brincadeira inocente com um dos participantes que culminou na liberdade para que ele retribuísse. Apesar de ele não ser cristão, a retribuição mesclada de malícia e maldade me pegou de surpresa e desencadeou uma série de outras brincadeiras com os outros participantes, todas maliciosas. Imediatamente senti a acusação do Espírito Santo a respeito daquela falha, indiretamente causada por mim. Não fiz a brincadeira com maldade, mas abri a porta para que ele fizesse.

Assim que a reunião terminou, um outro participante da reunião, grande amigo meu, cristão, me chamou em uma conversa no skype e me disse a seguinte frase:
"Irmão, cuidado com as conversas, espero que não fique chateado por eu falar, mas precisamos vigiar e não participar de conversas vãs. Espero que me entenda, falo para seu bem e porque você representa a Deus por onde for amigo".
Prontamente me defendi, explicando o que já disse acima, não tive maldade na brincadeira, foi inocente, mas infelizmente resultou em algo que não foi agradável. Meu principal argumento foi "a culpa não foi minha". Mas ele sabiamente me respondeu com a seguinte frase: 
"...é que em algum momento você deu essa liberdade, eu também já fiz isso. É complicado meu irmão, como a palavra de Deus nos diz, somos luz e sal. Não podemos nos desligar nem um minuto do Senhor e essas conversas nos desligam. Mas fica em paz, amo tua vida e juntos vamos auxiliando um ao outro no amor, não no julgamento".
Logo após todo esse episódio que relatei, o Senhor trouxe a minha memória duas frases que em algum momento eu já havia lido. A primeira foi a de Martin Luther King[1] que diz "No final, não nos lembraremos das palavras dos nossos inimigos, mas do silêncio dos nossos amigos" e a segunda eu ouvi em uma pregação do Ariovaldo Ramos[2]. Nessa pregação, Ariovaldo cita um psicólogo suíço chamado Hans Bürky, que diz que "O reino de Deus é um reino de amigos". A associação dessas duas frases foi instantânea em minha mente e então senti a necessidade de escrever, compartilhar esse aprendizado com os leitores e ressaltar a importância dos amigos em nossa caminhada cristã.

Nem sempre agradável

Ouvir a verdade as vezes pode ser desagradável. Mas se de fato queremos saber as falhas que não percebemos e corrigí-las, precisamos que alguém nos diga. E quem melhor do que um amigo para essa tarefa? Se ouvimos uma crítica de alguém que consideramos um "inimigo", podemos crer que aquilo está sendo dito apenas como afronta e para ofensa. Por outro lado se ouvimos de um amigo, o impacto sem dúvida irá nos fazer no mínimo pensar a respeito.

O grande problema é que, se por um lado temos dificuldades em ouvir uma crítica, por outro existem os bajuladores ou falsos amigos, que pouco se importam conosco e nunca vão nos fazer as críticas que precisamos ouvir. Temos ainda um terceiro grupo, o dos amigos verdadeiros, mas que tem medo de nos dizer algumas verdades e prejudicar essa amizade que tanto presam.

Para aqueles que tem opinião formada sobre si mesmos, que se consideram eruditos teológicos principalmente, ouvir críticas é muito difícil. Temos que ter em mente que somos falhos, não existem "super crentes" que nunca erram. Logo as críticas podem nos ajudar no nosso crescimento espiritual, nos despertando para algo que não vemos sobre nossas atitudes. Lendo um artigo sobre o desenvolvimento profissional, me deparei com uma frase de Luis Felipe Cortoni[3], que podemos trazer para o meio espiritual. Ele diz que:
"Não acho que tudo que vem do outro é bom. Nem sempre o que se escuta é um fato, pode ser uma simples leitura, fruto da percepção alheia. Temos direito de recusar o que não é construtivo. Mas é essencial não tomar atitudes que fechem as portas para as críticas."
É extremamente importante tomarmos cuidado com as reações que expressamos quando alguém nos alerta, nos faz uma crítica. Durante meu desenvolvimento profissional, ainda quando estagiário, tive alguns treinamentos a respeito do comportamento no trabalho, principalmente sobre receber críticas. Isso foi fundamental para que eu crescesse profissionalmente e de quebra me ajudou também a ser receptivo a críticas teológicas ou, como no ocorrido que relatei no inicio, refletir a respeito do meu comportamento como um cristão que representa o Senhor. Nesse contexto de receber as críticas, acho que cabe perfeitamente o que Paulo escreve aos Tessalonicenses: "Examinai tudo, retende o que é bom" (1Ts 5:21).

Que amigos queremos ao nosso lado?

Quero propor algo pra você agora. Reflita sobre seus amigos, pense nos mais próximos, aqueles que você tem mais intimidade e responda a pergunta: Esses são os amigos que eu quero ao meu lado?

A primeira e principal caracteristica que eu acredito que deva ser usada em sua análise, é saber se esses amigos te aproximam de Deus. Atitudes como a do meu amigo, sem dúvida nenhuma me despertou para uma falha e me fez refletir, me humilhar aos pés do Senhor e pedir perdão. Não resta dúvida que isso me aproximou mais de Deus. Temos que ser rodeados de pessoas que estão preocupados com nossa salvação, com nossa proximidade de Deus. Esses devem ser nossos melhores amigos.

Na dificuldade são os melhores amigos que vão te trazer uma palavra de conforto da parte de Deus, são esses que vão te dar um abraço quando preciso, são esses que quando você cair vão te dar a mão pra te ajudar a levantar, são esses que quando você estiver fraco na fé vão ficar ombro a ombro com você e te auxiliar na caminhada rumo ao céu e são esses que quando necessário vão te repreender para que você desperte do erro.

Então precisamos nos afastar dos amigos não cristãos? NÃO. Não podemos ter apenas amigos cristãos. Se somos rodeados apenas de cristãos, conversamos apenas com cristãos, temos apenas amigos cristãos, pra quem vamos pregar? O que não podemos é ser influenciados pelo mundo, mas ao contrário disso, influenciá-lo. Somos sal e luz:
"Vós sois o sal da terra; mas se o sal se tornar insípido, com que se há de restaurar-lhe o sabor? para nada mais presta, senão para ser lançado fora, e ser pisado pelos homens. Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder uma cidade situada sobre um monte; nem os que acendem uma candeia a colocam debaixo do alqueire, mas no velador, e assim ilumina a todos que estão na casa. Assim resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras, e glorifiquem a vosso Pai, que está nos céus." (Mt 5:13-16) (grifo meu)
Que amigo eu quero ser?

Tão importante quanto os amigos que queremos ao nosso lado, é que amigo queremos ser. Quando olhamos para o relato bíblico do livro de Marcos (Mc 2:1-12), vemos o exemplo de quatro verdadeiros amigos. Sempre quando penso em que amigo quero ser e ter, lembro desses quatro que mostraram seu amor pelo amigo paralítico. Que mesmo com todas as adversidades, tiveram fé que Jesus podia fazer algo por esse amigo. Olharam para a situação e não pensaram em suas próprias possibilidades, mas pensaram nas possibilidades de Jesus.

Quando olhamos para um dependente químico, alcoólatra, um assassino, etc., não podemos pensar "esse ai está perdido, não tem jeito". Ele está perdido quando olhamos com os nossos olhos, com as nossas possibilidades. Mas quando começamos a olha-los como aqueles quatro olharam, através da perspectiva de Jesus, das possibilidades de Jesus, vemos que nada é impossível para o nosso Senhor. (Lc 1:37) 

Certa vez fui visitar uma igreja em outra cidade, havíamos sido convidados a fazer o louvor naquele dia. Enquanto louvávamos, entrou um mendigo na igreja, ele estava bêbado. O violonista da equipe, teve uma atitude admirável que serviu de lição para mim e para os demais que ali estavam e viram a cena. Como eu estava de frente para a igreja, pude ver o processo completo. O mendigo entrou na igreja e se sentou no ultimo banco. Ninguém falou com ele, o cumprimentou ou o orientou a nada como era feito com todos que visitavam a igreja. Quando encerramos o louvor, meu amigo violonista, desceu do púlpito e foi até o mendigo, pediu que ele se levantasse e deu um abraço no mendigo e disse algumas palavras para ele.  O mendigo chorou e abraçou meu amigo de novo.

Após o término do culto, admirado daquela atitude linda e ao mesmo tempo curioso, fui perguntar o que ele havia dito ao mendigo. Ele respondeu: 
"Apenas disse à ele que Deus o amava e que eu o amava também. Que era pra ele voltar mais vezes para ouvir a palavra de Deus, para alimentar o seu espírito. Ele chorou e me disse que voltaria com certeza, que fazia tempo também que não ganhava um abraço."
Esse meu amigo, depois de um tempo nos contou que havia voltado naquela igreja e encontrado o "mendigo" novamente. Para nossa surpresa ele não era um mendigo. Estava "largado" daquele jeito por conta do seu vício, a família havia desistido de tentar ajudá-lo. Essa segunda visita mostrou um homem sóbrio, aceado e que não estava perdendo cultos. Estava firme com Jesus. A glória é toda de Deus. Meu amigo apenas colocou em prática o que a bíblia nos ensina, o amor ao próximo. Bom ter amigos assim para seguirmos o exemplo. Tão bom quanto, é sermos esse amigo que dá os exemplos.

Enfim...

Amigos que nos repreendem quando estamos errados, que não ficam em silêncio quando vêem nossas falhas, que nos dão exemplos, que nos auxiliam quando precisamos e que assim, certamente nos aproximam de Deus, são os amigos que mais precisamos ter ao nosso lado. Eu tenho alguns e quero mais amigos assim ao meu lado. E você, que tipo de amigos você quer ao seu lado?

Dou graças ao Senhor pelos amigos que ele colocou ao meu lado, que me ajudam e que eu posso ajudar também. Amigos que creio que vou reencontrar quando nossa batalha aqui findar. Hans Bürky tem razão, o reino de Deus realmente é um reino de amigos.

Já não vos chamo servos, porque o servo não sabe o que faz o seu senhor; mas tenho-vos chamado amigos, porque tudo quanto ouvi de meu Pai vos tenho dado a conhecer. (Jo 15:15)

Deus abençoe vocês, meus amigos.


[1] Martin Luther King Jr. (1929-1968) foi um pastor protestante e ativista político estadunidense. Tornou-se um dos mais importantes líderes do movimento dos direitos civis dos negros nos Estados Unidos, e no mundo, com uma campanha de não violência e de amor ao próximo.
[2] Ariovaldo Ramos é escritor, articulista e conferencista com larga experiência na missão da igreja.
[3] Luis Felipe Cortoni é sócio-diretor da LCZ Desenvolvimento de Pessoas e Organizações.

Um comentário:

  1. Que Deus continue lhe dando sabedoria, para que de forma simples todos que lerem suas reflexões possam aprender mais sobre a palavra. Nada melhor que poder testemunhar as maravilhas que nosso Deus faz em nosso meio.

    A paz da parte de Deus e de seu filho Jesus Cristo seja com você e sua família meu irmão!

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